Projeto da Sesa promove intercâmbio cultural com povos indígenas na produção de medicamentos fitoterápicos
18 de julho de 2025 - 14:03 #assistência farmacêutica #farmácias vivas #Interculturalidade #Povos indígenas
Assessoria de Comunicação da Sesa
Texto: Kelly Garcia
Fotos: Arquivo Sesa

A iniciativa é uma parceria da Sesa, por meio da Coordenadoria de Políticas de Assistência Farmacêutica e Tecnologias em Saúde (Copaf), com entidades públicas e sociedade civil (Foto: Aldeia Pitaguary)
O projeto Interculturalidade e Farmácias Vivas no Sistema Único de Saúde (SUS) avança com a implantação de hortos nas cidades de Caucaia, Maracanaú, Poranga e Itapipoca, para o cultivo de ervas medicinais. A iniciativa, selecionada pelo Ministério da Saúde (MS), é uma parceria da Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa), por meio da Coordenadoria de Políticas de Assistência Farmacêutica e Tecnologias em Saúde (Copaf), com entidades públicas e sociedade civil. O projeto contempla o plantio e o processo de produção e distribuição de medicamentos fitoterápicos para as comunidades indígenas de 17 municípios cearenses, com a participação de oito indígenas pertencentes a quatro etnias desses locais como agentes de cultivo.
De acordo com a farmacêutica e bolsista do projeto, Ana Georgina Pontes, o objetivo é trocar experiências e saberes das técnicas tradicionais e da cultura popular com o envolvimento de quatro comunidades indígenas na produção de massa verde, a primeira etapa para a produção de fitoterápicos. “As plantas medicinais irão passar por um processo de beneficiamento primário, para que possam ser transportadas secas para o horto da Sesa, a partir de onde os medicamentos produzidos serão distribuídos para todas as 17 comunidades indígenas do Ceará”, explica.

Serão distribuídas, ao longo do desenvolvimento do projeto, cinco mil mudas para as quatro etnias (Foto: Aldeia Tabajara)
Ao todo, serão três anos de produção, com visitas frequentes da equipe gestora do projeto, nos quatro municípios em que está ocorrendo o plantio. “Estamos sempre realizando reuniões de alinhamento das atividades nos hortos. Também capacitamos oito agentes de cultivo, que são integrantes das comunidades indígenas. Outro procedimento periódico é a análise microbiológica da água utilizada no cultivo.”
A iniciativa é resultado de uma parceria das secretarias da Saúde (Sesa), dos Povos Indígenas (Sepince) e de Desenvolvimento Agrário (SDA) do Ceará e do Conselho Estadual de Saúde (Cesau-CE), com o Distrito Sanitário Indígena do Ceará (Dsei/CE) e a Universidade Federal do Ceará (UFC), entre outras entidades ligadas ao movimento indígena.
Números
Segundo Ana Georgina, serão distribuídas, ao longo do desenvolvimento do projeto, cinco mil mudas para as quatro etnias. Após o cultivo e as etapas de produção, será feita a distribuição de 75 mil unidades de fitoterápicos para as Unidades Básicas de Saúde Indígenas e Centros de Atenção Psicossocial (Caps) dos 17 municípios.
“Os medicamentos fitoterápicos serão voltados para todas as comunidades indígenas do Ceará, em forma de sachês, tintura, pomada e xaropes, indicados como expectorantes, para uso dermatológico, e também os chás de capim santo e erva-cidreira, que funcionam como um auxílio no desmame de medicamentos psiquiátricos”, pontua.

Após o cultivo e as etapas de produção, será feita a distribuição de 75 mil unidades de fitoterápicos para as Unidades Básicas de Saúde Indígenas e Caps dos 17 municípios (Foto: Aldeia Tremembé)
Experiências e bem-estar
Morador da aldeia de Cajueiro, no município de Poranga, o agricultor Edson Pereira, 49, indígena do povo Tabajara, trouxe com ele, para o projeto de agente de cultivo indígena, o amor pelo trabalho com a terra e o domínio do cultivo de frutas e hortaliças.

Como a região é muito quente, o agricultor faz questão de ir até o horto todos os dias e restringe o acesso desordenado à área aonde as plantas estão (Foto: Aldeia Tabajara)
O plantio das ervas medicinais traz ainda um bem-estar extra, já que lembra a mãe dele, já falecida. “Eu me sinto tão em paz. Quando era criança, minha mãe sempre cuidava da gente com chás, tinha um canteiro com as plantinhas dela. Nos seus 88 anos de vida, acho que nunca chegou a ir a um hospital, por estar sempre muito bem de saúde”, disse.

Equipe da Copaf e do Dsei na comunidade indígena tabajara de Poranga (Foto: Aldeia Tabajara)
Como a região é muito quente, o agricultor faz questão de ir até o horto todos os dias e restringe o acesso desordenado à área aonde as plantas estão. “Nós aguamos duas vezes por dia e colocamos placas para que as pessoas não toquem nas folhas, porque, em algumas visitas, mudas murcharam. Eu acredito muito na energia das pessoas e acredito que tenha sido alguém com uma energia ruim”, destaca.
Aprendizado
A agricultora, artesã e boleira Rufina Ribeiro, 66, conhecida como Neta, mesmo com vasta experiência com os trabalhos com a terra, aprendeu técnicas novas de cultivo, mais eficientes, e de preparo dos chás, graças ao projeto. “Eu conhecia a forma de cultivo da terra porque tinha uma horta em casa, com legumes, verduras e plantas medicinais. No entanto, o cuidado em regar duas vezes por dia, priorizando o caule e o solo, aprendi no projeto”, disse.

A agricultora, artesã e boleira Neta Ribeiro com a equipe da Copaf da Sesa (Foto: Aldeia Pitaguary)
Outra diferença foi no preparo dos chás e lambedores. “Eu era acostumada a colocar várias ervas juntas, mas soube aqui que uma planta pode tirar o efeito da outra. Os nomes também são diferentes. Aqui, conhecíamos o chambá como anador e a erva que dizíamos ser boldo, na verdade, era a malva santa. Tudo é aprendizado”.
Para ela, os momentos no projeto tem sido terapêuticos. “Adoro estar em movimento, isso me traz mais energia e tira a fadiga, especialmente depois que tive uma virada na minha vida, há alguns anos, quando sofri um AVC”, relata a indígena do povo pitaguary, que mora em Maracanaú.
A agente de cultivo indígena Lucilene de Oliveira, 41, aprendeu o cultivo das ervas medicinais com a avó, Maria. “Minha avó tinha um canteiro nas matas, perto da sua casa, no Coité, em Caucaia. Aprendi com ela a plantar e a colher também, especialmente o tucum, para fazermos redes e outras peças, como pincéis e vassouras”, rememora a indígena, que faz parte do povo tapeba.
Lucilene credita sua saúde ao conhecimento sobre os chás, garrafadas e outros preparos tradicionais. “Eu só vou até o posto de saúde quando preciso fazer meus exames periódicos, como a prevenção do câncer de colo de útero. É muito raro eu adoecer, assim como os meus filhos”, diz.
Já Allana Veríssimo é uma das agentes indígenas mais jovens, com apenas 20 anos. Mesmo com a pouca idade, já sabia vários preparos, assim como a forma de cultivo. Isso porque os avós são os anciões que detém o conhecimento sobre as plantas medicinais na comunidade indígena tremembé da Barra do Mundaú, em Itapipoca.
“Eu já sabia sobre o poder calmante do capim santo, por exemplo, e também era acostumada a tomar a garrafada para a saúde da mulher. Aprendi muito com os meus avós e sempre estava junto deles para saber mais”, conta.

Allana Veríssimo é uma das agentes indígenas mais jovens, com apenas 20 anos e é agente indígena de cultivo do povo tremembé da Barra do Mundaú, em Itapipoca (Foto: Aldeia Tremembé)