Laços da maternidade: mães atípicas e os desafios para conciliar família e profissão

6 de maio de 2024 - 10:30 # # # # #

Assessoria de Comunicação da Sesa
Texto: Kelly Garcia
Foto: Kelly Garcia e Arquivo Pessoal
Arte gráfica: Iza Machado Edição: Ariane Cajazeiras

Na semana que antecede o Dia das Mães, comemorado no próximo domingo (12), a Saúde do Ceará, por meio de uma série de reportagens, explora a força e a beleza dos laços que as unem aos filhos, transcendendo os desafios e celebrando essa jornada única. Na primeira delas, vamos conhecer as histórias de mulheres trabalhadoras da Saúde que lidam com a maternidade atípica, uma trilha repleta de descobertas e dificuldades, permeada por muito amor.

A enfermeira Ana Virgínia Justa é servidora da Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa) há 38 anos. Com passagens pela Atenção Primária e pela Central de Regulação, bem no início de sua trajetória profissional, fez um curso de estimulação precoce, voltado para o desenvolvimento infantil de crianças com distúrbios do desenvolvimento neuropsicomotor, como a microcefalia, paralisia cerebral e síndrome de Down, entre outros. Ela não sabia, porém, que essa capacitação teria valor ainda maior na vida pessoal.

Ana Virgínia Justa é servidora da Saúde do Ceará há 38 anos

Virgínia continuou trabalhando, teve dois filhos e, na terceira gestação, descobriu que seria mãe de uma criança com Síndrome de Down. Com a notícia, soube que sua vida nunca mais seria a mesma, mas decidiu, desde o início, possibilitar à caçula, Ana Valentina, a melhor qualidade de vida possível. “Ela veio para transformar a vida da gente. Sua chegada foi um ganho para a nossa família. Desde os quinze dias de vida, minha filha tem os atendimentos específicos para o seu desenvolvimento e procurávamos sempre estimulá-la também em casa. Isso fez toda a diferença”, lembra.

Logo no primeiro semestre de vida de Ana Valentina, Virgínia enfrentou um obstáculo: o diagnóstico de um neuropediatra, que pediu que a mãe não tivesse grandes expectativas porque a síndrome iria atrasá-la muito em seu desenvolvimento. “Eu não aceitei esse diagnóstico e continuei buscando estimular a minha filha. Procurei o Sistema Único de Saúde (SUS), que é onde temos os melhores profissionais, e voltei dali a alguns meses, mostrando todo o desenvolvimento da Ana Valentina, que já sentava e queria se levantar, ao contrário do que o médico havia previsto”, recorda.

Até os sete anos, Ana Valentina fez suas terapias no Núcleo de Tratamento e Estimulação Precoce (Nutep) da Universidade Federal do Ceará (UFC). Foi lá também que a enfermeira se tornou palestrante. “Nossa família foi exemplo para quem tinha uma resistência maior a aceitar a síndrome. Foi um trabalho muito gratificante poder falar para esses pais e mães sobre como aceitar melhor as dificuldades que essa condição impõe e evitar a rejeição”, destaca.

Toda a família de Ana Virgínia engajou-se nas terapias que favoreceram o desenvolvimento da filha caçula

Para conseguir conciliar as terapias da filha com o seu trabalho, Virgínia Justa contou com o apoio da família e a compreensão da sua equipe. “Fazíamos um revezamento entre eu e meus dois filhos, para levá-la e, muitas vezes, eu ia acompanhá-la e depois voltava com ela para o trabalho. Organizei meus horários para poder ir e envolvi toda a família nisso”, diz.

Para se manter bem, a enfermeira investe o tempo livre com atividades que lhe dão prazer. “Eu amo dançar, ler e considero que minha fé me ajudou muito. Sou católica praticante e confio muito em Deus e Nossa Senhora. Sempre entrego a Eles as minhas angústias e procuro estar sempre sorrindo”, diz.

Hoje, Ana Valentina tem 17 anos e novos desafios têm se imposto para a família. “Ela estuda em uma escola regular, tem uma vida normal dentro das suas possibilidades e procuro estimulá-la a ter uma certa independência. Ela quer se casar e ser mãe e eu não vou me opor a isso. Ela tem esse direito e sei que algum dia poderá encontrar alguém para ter sua própria família”, completa.

Apoio de mãe para mãe é fundamental para conciliar trabalho, família e estudos

Supervisora da Central de Leitos da Coordenadoria de Regulação do Sistema de Saúde (Coreg) da Sesa, Marília Carvalho, é estudante de Enfermagem e trabalha há 11 anos na Secretaria. Tem dois filhos: Marden, de 4 anos e Lucas Gabriel, de 6 anos.

Para conciliar o trabalho com os estudos e as terapias do filho mais velho, que tem autismo e epilepsia, ela conta com o apoio da mãe. “Meu curso de Enfermagem, eu vou concluir no dobro do tempo porque precisei trancar durante as gestações. Não é fácil ser mãe solo, estudar e trabalhar. Mas sou grata a Deus e à minha mãe, que sempre me ajudou. Esse ano, irei me formar e estou feliz com essa conquista”.

Marília Carvalho tem o desafio de conciliar maternidade, trabalho e estudos

Ao descobrir os problemas de saúde de um dos filhos, a supervisora, por conta da falta de conhecimento sobre o assunto, entristeceu-se e demorou um pouco para aceitar a nova realidade. “Na época, eu não sabia o que realmente era o autismo. Hoje, meu filho me dá forças de onde não tenho e vive uma vida praticamente normal, com as terapias e medicação”, conta.

A organização e a ajuda da sua rede de apoio também contribuem para que ela consiga manter a rotina movimentada, que inclui aulas dois dias na semana, no período da manhã. “Meus filhos passam o dia todo na escola e minha mãe quem vai buscá-los. De noite, meu tempo é todo deles. Faço o jantar, ensino as atividades da escola e brinco um pouquinho. Depois, dou um banho e coloco para dormir, porque eles acordam cedo para ir para a escola. Vou para a faculdade pela manhã, nas minhas folgas do trabalho, porque trabalhamos em regime de plantão”, diz.

A musculação e os passeios com os filhos, assim como a igreja, ajudam Marília a manter a saúde mental em dia. “A academia é a minha terapia e a igreja também me ajuda a lidar melhor com o transtorno do meu filho. Estar com eles e sair juntos também são momentos preciosos que deixam a minha rotina mais leve”, conclui.