Janeiro Roxo: detecção precoce ainda é desafio no combate à hanseníase

16 de janeiro de 2024 - 10:46 # # # #

Assessoria de Comunicação da Sesa
Texto e fotos:Kelly Garcia
Arte gráfica: Iza Machado

O motorista Ermênio Pereira notou um inchaço nos pés e nas mãos. Ele está em tratamento há dois meses e foi diagnosticado com hanseníase no Centro de Convivência Antônio Diogo (CCAD). Foto: Elionária Lima

Dormência no pé e manchas avermelhadas em uma das pernas. Esses foram os sintomas que levaram o comerciante Jorge Mesquita a se preocupar se estaria com hanseníase. Ele já conhecia a doença por ter visto de perto a longa agonia da avó, que perdeu uma das pernas por conta das lesões e acabou morrendo em decorrência das complicações da diabetes. No entanto, se não fosse a insistência da esposa e da mãe, ele não teria procurado o serviço médico. “Depois que passei a não sentir a parte de trás da perna, me assustei e segui o conselho delas, de procurar um médico”, disse. 

Morador de Itapajé, na Região Norte do Estado, ele é acompanhado, duas vezes por mês, no Centro de Dermatologia Dona Libânia, equipamento da Secretaria da Saúde do Estado (Sesa), referência no Ceará para doenças dermatológicas. O caso de Jorge é tratado em Fortaleza por conta da complexidade, mas, de maneira geral, são os Postos de Saúde que realizam o diagnóstico e tratamento da doença, de acordo com a diretora técnica da unidade de Saúde, Araci Pontes. 

Dormência no pé e manchas avermelhadas em uma das pernas foram os sintomas que levaram o comerciante Jorge Mesquita a se preocupar se estaria com hanseníase

A hanseníase é uma doença contagiosa causada pela bactéria Mycobacterium leprae. “Os sintomas iniciais são manchas avermelhadas, acastanhadas ou mais claras que a pele, sem sensibilidade. Em uma fase mais avançada da doença, podem ocorrer deformações irreversíveis e até perda de membros”, destaca. O dia 26 de janeiro é o Dia Mundial Contra a Hanseníase e por conta da data, o mês ganhou a cor roxa para alertar a sociedade sobre a doença, que possui tratamento gratuito por meio do Sistema Único de Saúde (SUS).

Números

Apesar dos esforços para combater a hanseníase, o Ceará ocupa a sexta posição entre os estados que mais registram casos da doença. Já o Brasil é o segundo país no mundo neste ranking. De acordo com o boletim epidemiológico mais recente, divulgado no dia 12 de janeiro pela Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa), entre 2010 e 2022, foram notificados 22.248 casos. Destes, 1.115 eram casos em menores de 15 anos, o que sugere a presença endêmica da doença.

O Centro de Dermatologia Dona Libânia foi responsável pelo diagnóstico de 25% das notificações no Ceará em 2022. Dos casos registrados neste ano, 11,3% dos pacientes apresentavam Grau de Incapacidade Física 2, que se refere a alterações motoras em olhos, mãos, ou pés ou deformidades visíveis irreversíveis.

O Centro de Dermatologia Dona Libânia foi responsável pelo diagnóstico de 25% das notificações no Ceará em 2022

 

 

Para evitar esse tipo de sequela, é importante a detecção precoce, aponta a dermatologista Araci Pontes. “A hanseníase tem cura e, desde a década de 1980, os antibióticos são altamente eficazes. Por isso, o paciente deve iniciar o tratamento o quanto antes, para interromper a transmissão e não ter sequelas. A medicação já interrompe a transmissão na primeira semana”, diz. 

Os Postos de Saúde são as portas de entrada para o diagnóstico dos casos de hanseníase. “Nas Unidades de Atenção Primária é realizado o tratamento por meio da poliquimioterapia (PQT) com dose supervisionada mensal. Além disso, são avaliados os contatos domiciliares das pessoas diagnosticadas com a doença. A Atenção Primária à Saúde é parte elementar no manejo clínico da hanseníase”, destaca a assessora técnica da Coordenadoria de Atenção Primária à Saúde (Coaps), Ercelina Cavalcante.

O período de tratamento pode variar de seis meses a um ano, com antibióticos de uso diário, fornecidos pelos postos de saúde. “O diagnóstico, feito na atenção básica, é eminentemente clínico, baseado na observação. O teste principal é o de sensibilidade térmica, em que comparamos a sensibilidade da pele sadia e da pele com lesão”, explica. 

O estigma social em torno da doença ainda é muito forte. No entanto, o antídoto para o preconceito é a informação. “Com a descoberta do tratamento, até o nome da doença, que era lepra, mudou para hanseníase. Hoje, é totalmente curável. E o paciente pode conviver normalmente com sua família, realizar suas atividades, trabalhar. Por isso, se você notou algum desses sinais iniciais, como dormência na pele ou manchas, não tenha medo do diagnóstico. Procure uma unidade de saúde o quanto antes. Rapidamente, você vai estar curado e sem nenhuma sequela”, garante.

CCAD possui ambulatório de atendimento especializado em dermatologia

Em Redenção, o Centro de Convivência Antônio Diogo (CCAD) atua no diagnóstico da hanseníase há 95 anos. Segundo o diretor-geral do CCAD, Assis Guedes, a unidade de Saúde recebe pacientes com suspeita de hanseníase encaminhados dos municípios de Redenção, Acarape e Barreira. “O nosso ambulatório de dermatologia funciona às sextas-feiras por todo o dia e dispõe de médico dermatologista, enfermeiro, assistente social e fisioterapeuta. Além da avaliação médica clínica, também realizamos coleta de linfa para a baciloscopia, biópsia, avaliação neurológica simplificada e prevenção de incapacidade física em hanseníase. Caso o diagnóstico seja confirmado, o paciente já sai com os encaminhamentos necessários para iniciar seu tratamento em sua origem, retornando apenas se houver alguma intercorrência”, diz. 

Em Redenção, o Centro de Convivência Antônio Diogo (CCAD) atua no diagnóstico da hanseníase há 95 anos. Foto: Carlos Alberto Jr.

Um dos pacientes atendidos pelo CCAD foi o motorista Ermênio Pereira, que notou um inchaço nos pés e nas mãos. Ele está em tratamento há dois meses. Essa é a terceira vez que Ermênio Pereira tem hanseníase. 

Mesmo curado, o motorista teve hanseníase novamente porque voltou a ter contato com o bacilo, através de alguém sem tratamento. “Cerca de 95% da população, mesmo entrando em contato com o bacilo, têm imunidade contra a hanseníase. No entanto, parentes diretos de pessoas que foram acometidas com a doença têm uma tendência maior a serem infectados, por uma questão genética. Por isso, são frequentes casos na mesma família”, esclarece a diretora técnica do Centro de Dermatologia Dona Libânia.